PATRIMÓNIO
Considerações paisagistas em Oia
(89ª parte)
Mosteiro cisterciense de Santa María la Real de Sacramenia (Segovia)
ENCONTROS POLIORCÉTICOS / Oia
Crise do Coronavirus tem desferido golpes letais ao turismo. Se as mudanças climáticas já demandavam atitudes previdentes e tomadas de posição, as pandemias que aí possam vir reclamam uma nova focalização bem como novas e alargadas previdências neste setor. Mundialização da atividade e padronização universal das suas operações impõem restrições nunca desejadas da parte daqueles que pouco ou nada calcularam sobre os riscos decorrentes de uma escassa sustentabilidade. Oferta turística força-se, canaliza-se e até cria hábitos de implantação nas comunidades receitoras locais. Subserviência e pauperização das primitivas economias locais é um facto; substituição destas obedece a regras vindas de fora, passíveis de ficarem cronificadas para sempre. Globalização do turismo traz uniformização e perda de autonomia das comunidades "felizmente" contempladas. Um processo unidirecional de absorção fez com que as opções lógicas e sustentáveis nada pudessem opor face ao poder de promotores e "tour operators". Corredores ditos turísticos impunham o seu ditado quer "sazonal", quer "cultural" e sempre ou quase sempre urbanizador. Participação pública era igualmente sancionada por decreto, criando inautenticidade e febleza. Em resumo, era irritantemente apadrinhada.
A incorporação que vai trazer um projeto urbano de nova planta em Oia fará toda a diferença, determinando um antes e um depois naquele âmbito todo, criando um "modus operandi" onde equilíbrios entre razões patrimoniais e de mercado são escoados entre a opinião pública com total descaramento. Novidade em Oia alicerça-se, no entanto, na ausência da observância e primado das leis. Paralelamente ao desprezo pela última paisagem, protela-se uma normativa patrimonial que, ao que tudo indica, não está a ter efeito num BIC unicamente genérico, ancorado nas turbulências de 1931 e das quais tiram proveito (e até fama!) estes senhores da "RMO". Oia foi alvo de apetências ligadas a esquemas próprios dos anos oitenta e noventa do século passado, onde principiara isso do "turismo cultural" (compartilhado obviamente com a ganância!). Aquilo que desconhecem ainda hoje os destrutores da paisagem são leis que, defensáveis hoje e em época recuada, afirmavam a defesa de David perante o Golias. Isto se traduz numa verdade rotunda: Não chega o respeito testemunhal pelo Património, faz falta um rigor legal que afaste aos gananciosos do nosso espólio, da nossa herança. Âmago do problema em Oia será a salvaguarda da sua paisagem última. É muito normal "estar com a pedra no sapato", poder ver "o reverso da medalha" e finalmente desconfiar.
Em 13 de maio de 1933, aquando a II República Espanhola, era aprovada a Lei de Proteção do Tesouro Artístico Nacional (LPTAN); um texto respeitado mais de cinquenta anos depois, sob o franquismo, que vai trazer ao de cima questões de plena atualidade. Dois anos após a declaração vaporosa do mosteiro de Oia, Monumento Histórico Artístico de Interés Nacional, surge esta norma inspirada por Fernando de los Ríos e Leopoldo Torres Balbás. Trata-se de um texto vanguardista, adiantado no tempo, que introduz definições de permanência. Pouco tempo antes, a Constituição de 1931, no seu artigo 45, dizia: "Toda a riqueza artística e histórica do país, seja qual for o seu dono, constitue um tesouro cultural da Nação e estará sob a salvaguarda do Estado, que poderá proibir a sua exportação e alienação, e decretar expropriações legais que ache oportunas para a sua defesa". Também, Artigo 2 da LPTAN fazia efetiva a coadunação dos conjuntos urbanos e lugares pintorescos, de molde a serem incorporados no Catálogo de Monumentos Histórico-Artísticos, preservando-os de destruições ou reformas. Nesta normativa já paira no ar a tutela dos futuros BENS AMBIENTAIS. Curioso será conferir como nos seus artigos 14 a 17 persiste a limitação da aplicação das medidas de proteção UNICAMENTE PARA AQUELES MONUMENTOS DECLARADOS ATRAVÉS DO TRÁMITE ADMINISTRATIVO DE INCOAÇÃO DO EXPEDIENTE DE DECLARAÇÃO. Proibem-se, aliás, derrubos ou realizações de obras sobre os mesmos. No entanto, a errada expropriação de bens no mosteiro do ano de 1932 perturbou o normal seguimento procedimental. Isso e a recuperação da propriedade privada em sucessivas mãos despoletou o resto.
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