24 de maio de 2020

OIA

PATRIMÓNIO

Considerações paisagistas em Oia
(94ª parte)



ENCONTROS POLIORCÉTICOS / Oia        

 Vamos falar de San Lourenzo de Carboeiro, prístino e singular mosteiro não ligado ao grupo "ACIGAL" mas sim às formas estilísticas do Císter. Prístino sim, embora ruinoso num passado não muito longínquo e, portanto, alvo de um meritório processo de reabilitação no tempo que aínda não acabou. A história de Carboeiro e das sucessivas intervenções recuperadoras nas suas estruturas serve de contraponto a todos aqueles que contam estéreis relatos patrimonialistas, sob o álibi da turistificação mais descarnada.  É por causa disso que em Oia está-se a regredir, garantidamente. Não há razões que possam validar a permanência da "ACIGAL" na Carta Europeia do Císter; nesse intuito, fundamentaremos a presente colaboração escrita. 

 Em primeiro lugar, as ações reabilitadoras  em San Lourenzo de Carboeiro têm tido diferentes pegadas e autorias, obedecem a critérios ligados aos conceitos tradicionais do restauro e traduzem até algum que outro desencontro ou diferendo à hora de concretizar a recuperação do monumento em termos gerais. Em Oia, porém, visa-se escoar um empreendimento urbanizador da mão de uma LPCG desvalorizada, disposta a trançar num único negócio um mosteiro com um hotel-talasos e umas ditas vilas turísticas, respetivamente. Carboeiro, na sua atribulada sobrevivência, aguentou uma longa noite de pedra e soube conciliar as suas carências com as suas potencialidades. Resultado é hoje conferível: escolas desse restauro estão presentes nas várias interpretações a auferir. Se olharmos aos testeiros dos mosteiros cistercienses de Moreruela  (Zamora), Fitero (Navarra) ou Veruela (Zaragoza) acharemos semelhanças formais com Carboeiro, ficando obviamente admirados por isso. Não seria a primeira vez  que se patenteiam as similitudes ou os desencontros de  beneditinos e cistercienses. Em Carboeiro regista-se também uma adustez própria do Císter nos panos de silharia externos ou na ausência de ornamentação figurativa de capitéis e canzorros. Da mesma maneira, o alteamento e a procura de verticalidade no presbitério ou nos arcos formeiros peraltados fala-nos de um tardorromânico que está à vista. Chama a atenção um sistema de medições surpreendente nessas três naves e no transepto; transepto de 17 metros de comprimento por 5 metros de largura a querer condizer em harmonia com um corredor perpendicular central de 20 metros até o deambulatório. Parece-nos um desenho em planta perfeitamente ousado, se nos for permitida tal aceção, e até vanguardista para a época. Mais surpreendente resulta aínda o desenvolvimento espacial da cabeceira com essas 3 capelas radiais cujo decalco em planta, íngreme, olhando para o rio Deza, advém numa grande cripta de 7 metros empoleirados. Capelas radiais de cima, grandes demais, oferecem-nos 4 metros de penetração axial, em jogo com um total de cinco espaços do deambulatório. Esses ábsides externos aparecem em baixo morfologicamente abrangidos por uma cilha que os une.   





 Quantos destes mosteiros andarão ao relento, no meio do nada patrimonial, à espera de uma qualquer reabilitação das coberturas ou mesmo das suas estruturas portantes?. Imaginam uma nova epistemologia patrimonial baseada na recuperação não somente virtual de nervaturas, de crucerias, mas também real? Chega contemplarmos claustros e "olharmos para os terceletes" como quem olha "para o boneco" (sem olhar realmente para boneco nenhum). Chega de visitinhas desprovidas do verdadeiro corpo patrimonialista, onde o que prevalece são as "falinhas mansas" e a linguagem lisonjeira. Visitas que, pondo por caso, custam em  Veruela (Zaragoza) um euro e oitenta, ao pé dos cinco eurazos que pedia em tempos a "RMO" em Oia.  Comparativas têm a sua utilidade (sic).   





 Intervenções em Carboeiro nada têm a ver com as tramoias e matreirices registadas em Oia ao longo de catorze anos. Desde os tempos do Enrique Barreiro e Chueca Goitia, em que se faz a classificação de entulhos de algum valor e o acometimento da cimbra de tijolo como referência de todo o testeiro, até a impermeabilização das abóbadas do deambulatório, reconstrução de naves laterais, cimentação de pilares e crucerias ou sustentação estrutural de futuros muros (1975), fez-se uma abordagem inesperada quanto ao trabalho de simplificação de peças (silhares, aduelas, cornijas, canzorros ou capitéis) que já suscitou os primeiros pros e contras. Barreiro trabalhou também no extremo norte das dependências monacais. Apartir de 1991, a equipa de  Baltar, Bartolomé, e Almuiña tomou as rédeas das obras cobrindo a nave principal e o transepto, consolidando e impermeabilizando as abóbadas de cabeceira e instalando um lucernário na cumeeira, com utilização resolutiva de malhas betonadas de ferragem nessa cabeceira ou de aço ondulado nos plementos. Sublinhável de todo foi a reinterpretação das cobrições com nervaturas em madeira, novidade marcante que a muitos causou surpresa e que vieram para ficar. Finalmente, a aportação do Iago Seara desde o ano de 2004 consistiu na colmatação de vazios na igreja abase de vidro temperado, remate geral de encontros nas silharias ou drenagem de muros húmidos. Interveio igualmente no pátio ou antigo claustro e ao leste das antigas dependências monacais, substituindo aliás o lucernário sobre a nave central do templo. Em janeiro de 2020 Carboeiro não dispunha de rede elétrica, estando sujeita a obras de reparação e restauração com um orçamento de 290.000   euros, estabelecido pela Conselharia de Cultura e Turismo. Concelho de Silleda e Diocese de Lugo são os proprietários do espaço, estando o cenóbio a margem da ACIGAL. Contabilizava-se uma despesa inicial de 360.000 euros, conforme informação na imprensa de 30 de agosto de 2018, ficando logo em 323.000 euros tal importância (?!), com prazo de execução de quatro  anos e meio, de molde a eliminar humidades e filtrações no templo e salas do mosteiro e tendo como bases de atuação:    

1. Limpeza e reparação da cobertura da igreja. 
2. Limpeza de fachadas. 
3. Melhora das janelas das torres. 
4. Reparação de muros do mosteiro. 
5. Reabilitação da coberta da antiga casa monacal.    

 Pelo sim, pelo não, estes demorados empreendimentos podiam ter prestado alguma atenção às portas Sul e Oeste. A primeira perdeu colunelos e figuras do tímpano, conservando na arquivolta grande 11 florões e na pequena 6 anjos com as asas abertas, para além do Cristo em Majestade mutilado da chave. Porta Oeste também possuia figuras no tímpano, dispondo de 4 arquivoltas carentes de colunas onde o destaque vai para os 23 anciões do Apocalipse. Pegada compostelana faz-se sentir.     

 Logo após a crise da Charte Européenne, surgida em Noirlac (2017), continuada na Assembleia Geral Extraordinária de Piedra (2018) e aparentemente resolvida na Assembleia de Timadeuc (2019), mediante a modificação do artigo 3.3, segundo parágrafo dos Estatutos desta Charte, onde o que estava em discussão era a redução ou alargamento da representação nos seus órgãos, oculta-se uma contradição entre os chamados Princípios desta Carta Europeia Cisterciense (Independência/Legalidade/NÃO INGERÊNCIA/Europeidade e Serviço e Benevolato) e a sua Carta de Valores (nos seus artigos Primeiro, "Espirito do Lugar" e Terceiro,  "Compromisso de preservar e manter o património cisterciense material e imaterial", a tal ponto que PODERIA QUESTIONAR-SE A PERTENÇA DA "ACIGAL" À CARTA EUROPEIA.

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