19 de feb. de 2022

OIA

PATRIMÓNIO

Considerações paisagistas em Oia  

(184ª parte)    


Mosteiro de Santa María de Oia
Foto: Santiago Baz Lomba

ENCONTROS POLIORCÉTICOS / Oia

 Vamos  dar  continuidade  à  temática  hidraúlica  no  Císter  e  à  sua  importância  fulcral  no  trabalho  de  um  arqueólogo,  seja  qual  for  a  sua  adscrição  ou  independência  profissional.  Frequentemente,  as  linhas  diferenciadoras  deste  cometido  veem-se  deturpadas  por  outros  fatores  que  nada  têm  a  ver  com  a  finalidade  última  da  pesquisa  arqueológica,  qual  é  a  verdade  dos  achados.  O  quê  dizer  dessa  hidraúlica  presente,  e  não  presente,  nos  nossos  cenóbios?  Tudo  é  possível  e  passível  de  se  concretizar.  Trata-se  de  um  património  vasto,  difuso  e  parcialmente  subterrâneo,  de  acesso  escondido  ou  difícil,  que   se  estende  pela  vizinhança  das  suas  antigas  cercas;  hoje,  em  geral,  são  todas  de  propriedade  privada,  devido  ao  banimento  oitocentista  das  ordens  regulares  (desamortizações).  Com  a  desativação  e  o  abandono  destas  vetustas  obras  de  arte  -  são  acometimentos  por  descobrir  -  deixaram  também  de  ser  executadas  as  ações  periódicas  para  a  sua  conservação  e  limpeza  (razão  concludente  para  a  sua  intensificação  na  procura).    

 Sendo  assim  e  sujeitas  ao  passar  do   tempo,  temos  com  que  essas  canalizações  em  superfície,   ou  subterrâneas,  apresentem  roturas  e  entupimentos  que  provocaram  a  decrepitez  acelerada  dos  materiais  e  a  deformação  das  estruturas,  em  lastimável  estado  de  atomização  ou  ruína  iminente.  A  grandes  traços  são  estas  as  razões  exprimidas  pelo  professor  aposentado  pela  Universidade  de  Évora,  Dom  Jorge  Virgolino  Ferreira,  que  faz  questão  de  insistir  nestas  questões  que  outros,  pelos  vistos,  desprezam.  Dizer  unicamente  que  estudos  válidos  de  hidraúlica  císterciense  têm  sido  monitorizados  fundamentalmente  por  pessoas  como  o  engenheiro  D.  José  Duarte  Tavares  e  o  próprio  Virgolino  Ferreira  no  mosteiro  de  Alcobaça,  nem  mais.  Coube  assim  um  levantamento  espetacular  da  caleira  de  água  potável  nesses  obviados,  ou  ignorados,  3,2  quilómetros  de  distância,  até  ao  lavabo  no  interior  do  claustro  de  D.  Dinis.  Isto  somente  comporta  uma  coisa  fundamental:  a  revisão  dos  conteúdos  arqueológicos  implica  necessariamente  a  paralisação  da  dinâmica  construtiva,  diga-se  urbanizadora,  nos  espaços  monacais.  Paralisar  é  somente  isso,  submeter  à  pesquisa  prévia  e  ao  inquérito  um  território  abacial,  doa  a  quem  doer.   




 Para  isso,  temos  focalizado  este  assunto  num  mosteiro  cisterciense  longínquo  de  terras  portuguesas,  onde  a  veracidade  disto  que  defendemos  manifesta-se  'in  situ'.  O   Mosteiro  de  Santa  Maria  de  Carracedo,  em  Carracedelo  (província  de  Leão)  é  prova  dada  para  a  existência  de  sintomas  dessa  organização  hidraúlica  efetiva  e  constatável,  ainda  que  preterida,  do  sistema  hídrico  que  existiu.  Estamos  sim,  num  momento  inicial  da  pesquisa,  isto  não  se  pode  negar.  No  ano  de  1989,  com  autoria  de  D.  Fernando  Miguel  Hernández  e  sufragado  pelo  'Instituto  de  Estudos  Almerienses',  sai  do  prelo  um  trabalho  dedicado  ao  'Sistema  Hidraúlico  Inferior'  deste  mosteiro.  É  uma  obra  pioneira  e  promissória  que  deita  por  terra  muita  coisa,  a  começar  pelas  reservas  "interesseiras"  de  grupos  privados  ocupantes  de  bens  de  interesse  cultural,  de  monumentos,  ou  seja,  de  mosteiros  no  caso  que  nos  ocupa.  Os  estudos  sobre  o  Císter  e  a  sua  organização  hídrica  são  ainda  escassos,  contabilizados  com   a  mão,  constituindo  um  campo  de  atuação  premente  que  devia  ser  apoiado  primeiramente  pelas  instituições  autonómicas  e  universidades.  No  entanto,  LPCG  de  2016  tem   um  cunho  neoliberal  que  mostra  impiedoso  a  sua  face,  não  hesitando  um  só  milímetro  nos  seus  propósitos.  De  salientar,  quanto  ao  mosteiro  de  Santa  Maria  de  Carracedo,  as   suas  valorações  estratigráficas  que  indicam  uma  adscrição  baixo  medieval  para  as  condutas  cerâmicas  forçadas  ou  em  pedra,  bem  como  à  segunda  metade  do  século  XVI  e  século  XVII  para  as  restantes  estruturas.  Fica  assim  resumida a  hidraúlica  de  Carracedo:  CAPTAÇÃO  apartir  de  um  manancial;  CONDUÇÃO  através  de  canal  em   regime  aberto  sobre  muros  e  condução  forçada  em  tubos  cerâmicos  e  em  pedra;  DISTRIBUIÇÃO,  na  fonte, cozinha  e  lavatório;  EVACUAÇÃO  através  das  cloacas  de  expulsão  para  fora  do  mosteiro;  ESPECÍFICO  ABASTECIMENTO  HÍDRICO  DA  ADEGA,  com  poço  e  depósito.  A  condução  em  canal  aberto  traduzia-se  na  existência  de  sifões,  desarenadores  ou  arquetas.  

(Continuará)  

 Artigo precedente.

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