PATRIMÓNIO
Considerações paisagistas em Oia
(184ª parte)
ENCONTROS POLIORCÉTICOS / Oia
Vamos dar continuidade à temática hidraúlica no Císter e à sua importância fulcral no trabalho de um arqueólogo, seja qual for a sua adscrição ou independência profissional. Frequentemente, as linhas diferenciadoras deste cometido veem-se deturpadas por outros fatores que nada têm a ver com a finalidade última da pesquisa arqueológica, qual é a verdade dos achados. O quê dizer dessa hidraúlica presente, e não presente, nos nossos cenóbios? Tudo é possível e passível de se concretizar. Trata-se de um património vasto, difuso e parcialmente subterrâneo, de acesso escondido ou difícil, que se estende pela vizinhança das suas antigas cercas; hoje, em geral, são todas de propriedade privada, devido ao banimento oitocentista das ordens regulares (desamortizações). Com a desativação e o abandono destas vetustas obras de arte - são acometimentos por descobrir - deixaram também de ser executadas as ações periódicas para a sua conservação e limpeza (razão concludente para a sua intensificação na procura).
Sendo assim e sujeitas ao passar do tempo, temos com que essas canalizações em superfície, ou subterrâneas, apresentem roturas e entupimentos que provocaram a decrepitez acelerada dos materiais e a deformação das estruturas, em lastimável estado de atomização ou ruína iminente. A grandes traços são estas as razões exprimidas pelo professor aposentado pela Universidade de Évora, Dom Jorge Virgolino Ferreira, que faz questão de insistir nestas questões que outros, pelos vistos, desprezam. Dizer unicamente que estudos válidos de hidraúlica císterciense têm sido monitorizados fundamentalmente por pessoas como o engenheiro D. José Duarte Tavares e o próprio Virgolino Ferreira no mosteiro de Alcobaça, nem mais. Coube assim um levantamento espetacular da caleira de água potável nesses obviados, ou ignorados, 3,2 quilómetros de distância, até ao lavabo no interior do claustro de D. Dinis. Isto somente comporta uma coisa fundamental: a revisão dos conteúdos arqueológicos implica necessariamente a paralisação da dinâmica construtiva, diga-se urbanizadora, nos espaços monacais. Paralisar é somente isso, submeter à pesquisa prévia e ao inquérito um território abacial, doa a quem doer.
Para isso, temos focalizado este assunto num mosteiro cisterciense longínquo de terras portuguesas, onde a veracidade disto que defendemos manifesta-se 'in situ'. O Mosteiro de Santa Maria de Carracedo, em Carracedelo (província de Leão) é prova dada para a existência de sintomas dessa organização hidraúlica efetiva e constatável, ainda que preterida, do sistema hídrico que existiu. Estamos sim, num momento inicial da pesquisa, isto não se pode negar. No ano de 1989, com autoria de D. Fernando Miguel Hernández e sufragado pelo 'Instituto de Estudos Almerienses', sai do prelo um trabalho dedicado ao 'Sistema Hidraúlico Inferior' deste mosteiro. É uma obra pioneira e promissória que deita por terra muita coisa, a começar pelas reservas "interesseiras" de grupos privados ocupantes de bens de interesse cultural, de monumentos, ou seja, de mosteiros no caso que nos ocupa. Os estudos sobre o Císter e a sua organização hídrica são ainda escassos, contabilizados com a mão, constituindo um campo de atuação premente que devia ser apoiado primeiramente pelas instituições autonómicas e universidades. No entanto, LPCG de 2016 tem um cunho neoliberal que mostra impiedoso a sua face, não hesitando um só milímetro nos seus propósitos. De salientar, quanto ao mosteiro de Santa Maria de Carracedo, as suas valorações estratigráficas que indicam uma adscrição baixo medieval para as condutas cerâmicas forçadas ou em pedra, bem como à segunda metade do século XVI e século XVII para as restantes estruturas. Fica assim resumida a hidraúlica de Carracedo: CAPTAÇÃO apartir de um manancial; CONDUÇÃO através de canal em regime aberto sobre muros e condução forçada em tubos cerâmicos e em pedra; DISTRIBUIÇÃO, na fonte, cozinha e lavatório; EVACUAÇÃO através das cloacas de expulsão para fora do mosteiro; ESPECÍFICO ABASTECIMENTO HÍDRICO DA ADEGA, com poço e depósito. A condução em canal aberto traduzia-se na existência de sifões, desarenadores ou arquetas.
(Continuará)
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