PATRIMÓNIO
Considerações paisagistas em Oia
(164ª parte)
ENCONTROS POLIORCÉTICOS / Oia
Vamos fazer uma paragem no Forte de Ínsua, exemplo de mimese entre funções religiosas e militares, e falar da sua adesão ao 'Programa REVIVE' (com mais sombras do que luzes, seja dito tudo). ICOMOS - Portugal, através de um dos seus mentores principais, o arquiteto José Aguiar, não poupava críticas para um sistema de cedências aos privados em troca de uma 'mais do que pouca coisa' efetiva. 'Encontros Poliorcéticos' fez um desconto para o 'REVIVE', ingénuo talvez, no caso de Santa Maria de Bouro, obra de Souto de Moura. Mas a realidade fez-nos ver que tudo, provavelmente, tratava-se de uma miragem. Anos atrás, José Aguiar opinava assim: "Os Monumentos Nacionais não têm de ser todos pousadas e hotéis sem charme (parecem ter charme, mas não têm charme nenhum)". "Como se estivéssemos no grau zero de uma (desadequada) política de gestão patrimonial passa-se, perversa mas constantemente, para a opinião pública a ideia de que todos os fortes, antigos conventos e palácios têm de ser hotéis de charme ou (desmesuradas) pousadas. A conversão de monumentos nacionais em pousadas (e agora os "hotéis de charme" da moda) foi uma das ações históricamente mais destrutivas - dos valores estéticos, arquitetónicos e documentais - e socialmente estigmatizadas da nossa tradicão restauradora. Essa história negra deve ser relembrada agora que se multiplicam as vendas, ou cedências, de monumentos nacionais na posse do Estado para usos privados com fins lucrativos que EXCLUEM, ou LIMITAM FORTEMENTE, A FRUIÇÃO E O ACESSO DE TODOS OS CIDADÃOS A ESTES RECURSOS CULTURAIS E IDENTITÁRIOS (de todos) ".
'DiverLanhoso', o seu representante Hercílio Costa, promete só 20 quartos para a Ínsua (esta empresa gere o 'Parque Aventura' em Póvoa de Lanhoso.., todo um exemplo de atitude 'MACRO' à qual sempre apresentaremos contestação). Miguel Alves também promete isso, que vai ser respeitado o enformado monacal-militar e por aí fora. Até um arqueólogo alí destacado assegura o mesmo. Mas eles semearam a desconfiança e esta 'DiverLanhoso' não é recomendável, gerindo "daquela maneira" os seus negócios (futuro empirosamento da ilha abase de escapismos junto de empresas caminhenses de lezer). O problema é que ao início falam de vinte quartos para logo acrescentar essa quantidade; o problema é que um hotel de quatro estrelas tem mini-industrias a ele coladas ligadas à manutenção do próprio complexo - tratamento de roupas, produção de comidas - ; o problema disto tudo é que já ha precedências (vejam 'Fortaleza de Peniche', sobreutilizada pelo facto omnipresente da "razão- hoteleira", contestada pelo próprio Álvaro Siza Vieira, quem diz haver fortes pressões turistificadoras na 'REVIVE' e fora dela. Mas atenção, vem mesmo a calhar um apontamento endereçado ao próprio Siza Vieira no sentido dele confundir a adequação da sua ponte com o Forte Novo de Goião com a inegável ANTROPIZAÇÃO dessa envolvente, verdadeiro miolo do assunto). O que é que pensam fazer com o concessionado 'Forte da Barra do Aveiro' e outros tantos fortes costeiros, restringidos à visita pública visto eles passarem a mãos privadas? 'Moderna Economia Hoteleira' chegou ao Minho em força e está a fincar-se da mão dos privados que desrespeitam, muito em primeiro lugar, o direito ao desfrute público, sem entraves, dos monumentos ou bens culturais. Há um algo de inconsistente neste empreendimento de 6,5 milhões de euros onde Miguel Alves arrisca tanto politicamente. Se este investimento der para o torto, paisagisticamente falando, somos todos os afetados. Teria de ser equacionada atempadamente uma otra solução a falar de uma frontal reabilitação sem contrapartidas (no fundo são chantagens...) que impedisse essa aludida "linguagem hoteleira" num cenóbio. Algo está a deturpar o espírito de sempre no lugar; um lugar que pode ser comparado com o 'Forte das Berlengas' em Peniche, desde o ponto de vista paisagista. Cartão de visita no Minho fluvial vai ser um mau começo, já esta a sê-lo.
Desenho militar do forte consiste na absorção de um rectângulo religioso por um quadrado planimétrico, isso vê-se logo. As dependências perimetrais serão teoricamente aproveitadas para quartos. Não há garantias nenhumas, à partida, de salvaguardar alturas, bem como de coadunar a igreja de nave única e claustro com um resto digamos "civil de charme". Isto é contrasenso, é deturpação. Arranjo de uma embarcação própria da 'DiverLanhoso' para levar operários de ida e volta e cumprirem a sua jornada laboral fala talvez de um desafio que vai demorar o seu tempo, com certeza. O dado mais negativo do 'Programa REVIVE' é a continua cedência aos privados sem as necessárias exigências prévias, tal como ficam estabelecidas nas normas internacionais (Carta de Atenas do Restauro, de 1931; Carta de Veneza, de 1964). Na Galiza, estes textos são simplesmente obviados com total descaramento, podem acreditar nisso.
(Continuará)
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