PATRIMÓNIO
Considerações paisagistas em Oia
(120ª parte)
ENCONTROS POLIORCÉTICOS / Oia
Vamos falar da fachada do mosteiro de Monfero, rainha entre as rainhas do colossalismo e expressão simbólica de um poder religioso. À partida, as ordens clássicas greco-romanas no barroco eram respeitadas nos seus elementos constituintes, passando a ser frequentemente padronizados e sem aditivos. A ordem compósita em Monfero, e portanto romana, atinge nesta fachada a colmatação desse ideal à margem do renascimento, incorporando num mesmo plano a pretensão nada borrominesca de carregar essas linhas de base classicista. Para isso, incorpora num mesmo impulso quatro colunas e duas pilastras enormistas a adquirirem um protagonismo frontal, que abrange todas as alturas até o próprio entablamento, quebrando o friso e os seus tríglifos estandardizados e métopas circulares bem como alargando essa sensação de avanço até a cornija. O colossalismo é fator chave de toda a cenografia monferense; placas de lousa a contrastarem com o granito também ajudam a tal, muito embora se mantenham as dúvidas relativas à contemporaneidade dessas ardósias (há quem pense no aditamento posterior da tal estrutura dual, bicromática...), colocando interrogantes pertinentes e polêmicos sobre a distonia temporal dos planos fachadistas em Monfero. Devido a essa incongruência discutível de aparato, poderiamos pôr inclusivemente em causa a unicidade da própria fachada. Nada ajudará o desabamento parcial do canto esquerdo (visto de frente) das porções alternadas de esquistos e granitos, nos anos vinte ou trinta da passada centúria (ainda menos, esses planos de desmonte protagonizados quer pelo franquismo - iniciada na casa dos cinquenta do século XX -, quer pela ignorância citadina relativamente ao sentimento popular). Para além de corpos absorvidos pela monumentalidade compósita (vãos emarcados, frontões em mitra ligeiramente partidos ou matizados pela curvatuta da angulação, esse vão quadrangular abertamente acolhido pela rotura expressa do frontão, uma estatuária que vai acabar em insinuação de um outro santoral e por aí fora...) certo será que o comando é mantido pelas linhas comumente chamadas colossalistas. Ligação com Sobrado dos Monges, clara elevação verticalista do fachadismo, vai estabelecer semelhanças no interior do templo da igreja de Monfero; vejam então os casetões da grande nave única de 65 metros de penetração por 12,50 metros de largura, formando esse hieroglífico escassamente compreensível e misterioso feito de puro simbolismo (cruzes, luas, sóis, rostos, trisqueis, estrelas,..).
Ordem compósita, ao todo, representa uma sobreposição do jónico ao coríntio; nada fazia supor que fosse uma versão tardía desta segunda ordem. Inserem-se no capitel as volutas jónicas e as folhas de acanto corintias, com ábaco, florão, cálatos, caulículos, hélice, segunda coroa de acantos, primeira coroa de acantos, astrágalo, baquetão e listel (tal manda a compósita, sendo mesmo que estipula para o fuste 24 estrias a listeis, coisa que não acontece em Monfero visto as colunas estarem formadas por segmentos ou silhares graníticos curvos, não tambores, em número de 37-38 empilhamentos cada uma delas por fuste, enformando esse adossamento). Estas colunas mostram não só a típica éntase no primeiro terço de todo o seu comprimento, decorrente de um engrossamento em que o diâmetro aumenta de molde a reduzir a distorsão ótica, havendo no terreno teórico, aliás, outras deformações complementares tais como a redução do diâmetro numa das extremidades do fuste (afunilamento). Fica assim marcado também o diferendo entre sumóscapo superior e imóscapo inferior. Será necessário apontar como pormenor, dado importante, o caráter torto da coluna mais à esquerda (pode se atribuir tal facto a um qualquer desabamento, a quedas esporádicas de fábricas nesse lateral, aos efeitos de um raio), não deixando de ser um particular "naif" e uma curiosa singularidade junto das mencionadas lousas quadradas e rectangulares de piçarra do conjunto. Feita esta exposição, resumida numa dúvida exponencial entre colunas e pilastras de grande ordem e um pano global de placas xistosas, terá alguma lógica pensar se existe com efeito condizência entre ambas. Às vezes, até poderiamos esboçar sem disfarce uma dupla composição fachadista onde luta o plano clássico, ou dito clássico, e o forro esquistoso (novo ou velho) das placas de lousa (garantes a toda prova da viabilidade de um alçado). Peritos em durabilidade da ardósia datam em 150 anos, no mínimo, a "vida" destas láminas piçarrosas aderidas aos alçados de fachadas e não só. Esquistos mantêm a bom resguardo granitos expostos demais, ainda que resistentes, a todo o tipo de humidades e imponderáveis. Neste caso a lousa aparece amaciada nas placas na maioria dos casos, sem clivagem, dizendo muito em favor de um aprimorado trabalho de apuramento, seja qual fosse a sua data de implantação, de forro. São ao total 324 placas distribuidas simetricamente nas ruas, entrerruas e laterais de pilastras ligeiramente remetidas (o que vai favorecer ainda mais esse esquema barroco). Estas pilastras apresentam cinco caneluras, afigurando-se enchidas, maciçadas, em baixo. Temos outros pormenores nesta fachada: mútulos e gotas bem classicistas acima do friso, por exemplo.
Este território monacal está na íntegra quanto a limites, parecendo com certeza uma estrutura murada, quase que defensiva. Nos seus panos da parte sul temos pormenores interessantes: alvenarias em xisto a condizerem também com silhares graníticos nas partes nobres e estruturais; arcos de descarga; vãos capialçados; ménsulas a modo de matacães; contrafortes, etc...É urgente fazer uma chamada de atenção sobre o abandono que sofre atualmente Monfero. Um espaço mínimo de acolhimento na própria igreja serve para justificar o expediente (muito embora seja justo dar um desconto à gente da Associação de Amigos de Monfero). Lá, poucas pessoas conhecem a ACIGAL; nem sequer sabem da família Martínez ("Vasco-Gallega de Consignaciones", "RMO", "Kaleidos",...) nem do que pretendem concretizar em Oia. A tal urbanização simplesmente pareceu-lhes mal.
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